quinta-feira, 28 de outubro de 2010

II Afinal, mediunidade é faculdade orgânica ou faculdade espiritual?

Onde Herculano Pires errou?

         Vimos que a contradição entre a tradução do “Livro dos Médiuns” e o livro “Mediunidade”, ambos de Herculano Pires, é um problema dos mais graves, pois determina a direção de qualquer  discurso que trate da mediunidade, direção que pode ser a espiritualista ou a materialista, dependendo do partido que se tome.

         Se a origem da mediunidade for orgânica, seu estudo estará no âmbito das ciências físicas e biológicas.

Se sua origem for espiritual, deverá ser estudada nos limites da ciência espírita, já que a ciência acadêmica ainda se mostra incapaz de compreender o espírito, nem mesmo de aceitar-lhe a existência!

Necessitamos de outras opiniões, pois Herculano se mostra incongruente.

Vejamos outras traduções do mesmo parágrafo em questão:

“O desenvolvimento da mediunidade está em relação com o desenvolvimento moral do médium?
–Não, a faculdade propriamente dita prende-se ao organismo; ela é independente do moral; o mesmo não acontece com o uso que pode ser mais ou menos bom, segundo as qualidades do médium.”(O Livro dos Médiuns, capítulo XX-226-1. Tradução de Eliseu Rigonatti. Editora e Encadernadora Lúmen Ltda. Edição de 1966).

“O desenvolvimento da mediunidade guarda relação com o desenvolvimento moral dos médiuns?”
“Não;  a faculdade propriamente dita se radica no organismo, independe do moral. O mesmo, porém, não se dá com o seu uso, que pode ser bom, ou mau, conforme as qualidades do médium”. (O Livro dos Médiuns, capítulo XX-226-1. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, copyright 1944, 65a edição).



“O desenvolvimento da mediunidade está em razão do desenvolvimento moral do médium?
Não; a faculdade, propriamente dita, relaciona-se com o organismo; é independente do moral; não ocorre o mesmo com o seu uso, que pode ser mais ou menos bom, segundo as qualidades do médium.”(O Livro dos Médiuns, capítulo XX-226-1. Tradução de Salvador Gentile. IDE, copyright 1987, 67a edição 2003).

O desenvolvimento da mediunidade guarda relação com o desenvolvimento moral dos médiuns?
“Não. A faculdade propriamente dita reside no organismo; independe do moral. O mesmo, porém, não se dá com o seu uso, que pode ser bom ou mau, de acordo com as qualidades morais do médium”. .”(O Livro dos Médiuns, capítulo XX-226-1. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. FEB, copyright 2008, 1a edição).

Pelo que podemos observar, temos cinco traduções e apenas Herculano usa a palavra orgânica, será indício de seu erro?

Analisemos o original de Kardec:

CHAPITRE XX.
INFLUENCE MORALE DU MEDIUM.
Questions diverses.
226. 1. Le développement de la médiumnité est-il en raison du développement moral du médium ?
«Non ; la faculté proprement dite tient à l'organisme ; elle est indépendante du moral ; il n'en est pas de même de l'usage, qui peut être plus ou moins bon, suivant les qualités du médium.»
Aí está! Nosso problema reside na expressão tient à l'organisme, onde tient é uma conjugação do verbo tenir, terceira pessoa do singular. 
 Encontramos no dicionário Michaellis on line:
Tenir
vt 1 segurar, manter. vi 2 caber em. 3 provir, resultar, decorrer. tenir à fazer questão de. 

        Justificando as traduções:
Prende-se ao organismo (tradução de Eliseu Rigonatti).
Se radica no organismo (tradução de Guillon Ribeiro).
Relaciona-se com o organismo (tradução de salvador Gentile).
Reside no organismo (tradução de Evandro Noleto Bezerra).

Fica claro, portanto, que Herculano utilizou a acepção 3 provir, resultar, decorrer. (assim provem do organismo ou, é orgânica).

          Qual delas é a correta? 
       Devemos analisar melhor outros pontos da obra de Kardec para podermos decidir. 
Continua...



segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Afinal, mediunidade é faculdade orgânica ou faculdade espiritual?



Acredito que, quando lemos Kardec, nem sempre nos lembramos que estamos lidando com uma tradução do francês e, portanto, entregues aos cuidados dos tradutores.

         Felizmente os tradutores das obras básicas apresentam  uma boa qualidade linguística e doutrinária, por exemplo José Herculano Pires e Guillon Ribeiro. Mas nem por isso estamos livres de divergências nas traduções que podem gerar problemas doutrinários.

         Escreve Herculano Pires, em seu “Mediunidade. Conceituação da Mediunidade e Análise dos seus Problemas Atuais”. No capítulo IX, página 70 da 4a edição, 1997:

 “Quanto à ligação da mediunidade com o corpo, que muitos espíritas não entenderam, confundindo-a com uma suposta origem orgânica da mediunidade, trata-se de coisa muito diferente disso. A mediunidade está ligada ao corpo pelo espírito que a ele se liga, mas não pertence ao corpo e sim ao perispírito que enquanto estivermos encarnados faz parte do corpo e permite a ligação do espírito comunicante com o perispírito do médium”.

Afinal, mediunidade é faculdade orgânica ou faculdade espiritual?
E quando esta suposta confusão teria se estabelecido? Não sabemos responder com certeza, mas podemos afirmar que o  próprio Herculano Pires teve sua parte neste imbróglio!

Vejamos, de sua tradução, 21a edição, junho de 1999,  de “O livro dos Médiuns”, capítulo XX – Influência Moral do Médium:
226-1. O desenvolvimento da mediunidade se processa na razão do desenvolvimento moral do médium?
–Não. A faculdade propriamente dita é orgânica, e portanto independe da moral. Mas já não acontece o mesmo com o seu uso, que pode ser bom ou mau, segundo as qualidades do médium.

Como podemos ver, Herculano Pires condena a sua própria tradução!

Onde Herculano Pires teria errado? Em sua tradução ou em seu “Mediunidade. Conceituação da Mediunidade e Análise dos seus Problemas Atuais”?    continua...

domingo, 17 de outubro de 2010

Rubáiyat de Omar Khayyam


 Omar Khayyam, nascido em Nichapour, Pérsia, no ano de 1040, da era cristã, foi matemático e astrônomo de notória importância em sua época, poeta ácido, um tanto quanto embriagado pelo cinismo.
(Cinismo- Substantivo masculino. 1.Impudência, descaramento.2.Filos. Oposição radical e ativa às regras e convenções socioculturais.), 
Tão atual que chega a ser futuro. Publicaremos seus poemas do livro Rubáiyat pois é com ácido que se limpa os trilhos.
Rubáiyat 1
"Todos sabem que meus lábios nunca murmuraram uma oração.
Não procurei nunca dissimular os meus pecados.
Ignoro se  existem realmente uma Justiça e uma Misericórdia.
Mas, se existem, não desespero delas: fui sempre um homem sincero."

Viemos para


Há algum tempo venho estudando a doutrina espírita e no começo, como tudo o que é novo, foi uma mistura de todos os sistemas filosóficos que tinha visto e ouvido.

“Eu também sou Filho de Deus
Se eu não rezar, eu não vou pro céu.
Já fui pantera, já fui hipie beatnick
Tinha símbolo da paz dependurado no pescoço
Porque nêgo disse a mim
que era o caminho da salvação
Já fui católico, budista, protestante
Tenho livros na estante, todos têm a explicação
mas não achei, mas procurei ...”
É Fim De Mês Raul Seixas.

         Hoje estou pessoalmente mais seguro sobre o  caminho que percorro, estou finalmente no direção certa, o problema é a velocidade, muitas vezes parado observando o quê deve ser feito, e a vontade de corrigir a rota e assumir de vez os trilhos propostos por Jesus.

         Vamos nos lembrar de Tolstoi:
         “Não prego e não consigo fazê-lo, embora ardentemente o desejasse. Somente poderia pregar através das obras, e minhas obras são más. O que eu digo não é sermão, mas apenas uma impugnação à falsa compreensão do ensinamento cristão e uma explicação de seu sentido real... Repreenda-me – é o que eu mesmo me faço –, mas repreenda a mim e não ao caminho que trilho e indico àqueles que me perguntam onde é que, em minha opinião, fica a estrada! Se conheço bem o caminho para casa e sigo por ele bêbado, zigue-zagueando de um lado para outro... isso fará com que o caminho por onde passo seja errado?”  (Onde existe amor, Deus aí está. Leon Tolstoi).

         O que propomos, neste trabalho que iniciamos hoje, é fazermos um estudo de temas que pensamos ser equívocos neste trajeto do movimento espírita, mas como envio garrafas mensagens por todo o mar, espero que estas cheguem a alguém que possa me socorrer e venha a:

"Repreenda-me – é o que eu mesmo me faço –, mas repreenda a mim e não ao caminho que trilho e indico àqueles que me perguntam onde é que, em minha opinião, fica a estrada!"

Cântico Negro

Cântico negro José Régio

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!